quarta-feira, janeiro 08, 2014

A Religião É Uma Muleta?

            Os céticos costumam dizer que a religião é uma muleta. Ora, se a religião é uma muleta, qualquer coisa serve como muleta, então o problema não reside na religião, mas no indivíduo.
            O mais estranho é o indivíduo, sofredor por excelência, buscar consolo em algo que exige mais do que é capaz de suportar, levando o escritor Tolstói ao desespero: “Não julguem os santos ideais de Deus pela minha incapacidade de alcançá-los. Não julguem Cristo por aqueles de nós que imperfeitamente usam o seu nome... Se conheço o caminho para casa e estou andando por ele como um bêbado, ele não deixa de ser o caminho certo apenas porque estou cambaleando de um lado para outro! Se não é o caminho certo, então me mostre outro caminho; mas se cambaleio e perco o caminho, você deve ajudar-me, você deve manter-me no caminho verdadeiro, exatamente como estou pronto a apoiar você. Não me desencaminhe, não se alegre porque me perdi, não grite de alegria: ‘Vejam-no! Ele disse que está indo para casa, mas ali está ele rastejando em um atoleiro’. Não, não se regozije com o meu erro, mas me dê a sua ajuda e o seu apoio”.
         A religião cristã transfere ao indivíduo a responsabilidade por seus atos e consequências. Nesse caso, o melhor consolo para o indivíduo seriam as respostas psicológicas, sociológicas ou científicas que costumam transferir a “outros” a responsabilidade individual. A crença no gene egoísta é consolo para fracos. Transfere-se para os genes a responsabilidade que deveria ser do indivíduo.
            Mas, consideremos que a birra dos céticos encontre escoadouro: a religião é uma muleta. A muleta de Adão. A raça humana caminha com um coxear agonizante. Por isso, cada um arrasta o seu velho Adão para fora da cama, escova os dentes, toma banho, faz ele se vestir, coloca os sapatos em seus pés e vai manquitolando para a igreja.
          Espera-se que se continuar arrastando o velho Adão à igreja, ele, eventualmente, poderá tornar-se um cristão. E se ele se tornar um cristão – quem sabe? – talvez com o tempo tornar-se-á um espécime raro, aprenderá a caminhar corretamente, ainda que tropece de vez em quando.
       Triste não é usar a muleta que está à disposição, triste é preferir rastejar imaginando caminhar elegantemente. 
(Trecho do livro "Um Grito de Ausência" © de Samuel Rezende)

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